Ana Rita Alves (CES-UC) | É antropóloga e doutoranda no Centro de Estudos Sociais (CES-UC). Foi bolseira da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e, mais recentemente, uma das 2020-2021 Black Studies Dissertation Scholar da Universidade da Califórnia Santa Bárbara. O seu trabalho centra-se na análise crítica da interseção entre racismo institucional, território e habitação, materializando-se, até ao momento, num conjunto de publicações, em particular do livro Quando Ninguém Podia Ficar: Racismo, Habitação e Território (Tigre de Papel, 2021), comunicações e colaborações em diversos projetos de investigação. É cofundadora do “CHÃO – Oficina de Etnografia Urbana” que, em conjunto com a Associação de Desenvolvimento Social de Vale de Chícharos, tem desenvolvido uma cartografia social e aulas de alfabetização e português língua não materna no bairro da Jamaika. Tem colaborado, em solidariedade, com coletivos e moradores de bairros autoproduzidos e de realojamento, repositórios, por excelência, da violência institucional.

E se o Passado Teimar em Não Bastar? Fantasmas, Racismo e Produção de Conhecimento

Ana Rita Alves (coord.),
Cayetano Fernández, Cristina Roldão, Miguel Vale de Almeida

Resumo:

Há cem anos atrás, nascia, em Nova Iorque, o Harlem Renaissance – um dos mais importantes movimentos culturais Afro-Americanos do século XX – ilustrando de forma paradigmática a urgência de criar espaços de vida negra ante políticas de morte. De facto, quando o racismo se configurou historicamente como a produção e a exploração da vulnerabilidade de populações negras, indígenas ou Roma/ciganas à morte prematura (Gilmore, 2007), a resistência é condição essencial de existência, dos Estados Unidos ao Brasil, de França a Portugal. Porém, tanto os termos da opressão racial como a sua contestação têm sido veementemente despolitizados e silenciados através da manutenção de um sistema de privilégio epistémico, de um projeto de conhecimento (Silva, 2007) que sustenta e autoriza a violência racial – legal ou extralegal – como forma de governamentalidade. É deste modo que, quotidianamente, o terror racial se abate sobre tetos e corpos na Amadora ou em Santo Aleixo da Restauração ou sobre corações encarcerados que deixam de bater em Tires ou no Linhó. Pese embora a violência racial seja gramática das democracias contemporâneas e um conjunto de trabalhos académicos se debrucem sobre espaços, vidas e instituições profundamente marcadas pelo capitalismo racial, a raça como lente de análise ou o racismo como processo de gestão estrutural e institucional têm estado, em larga medida, ausentes do debate académico, em Portugal. A esta ausência soma-se ainda a obliteração da produção de intelectuais não-brancos, como W. E. B. Du Bois, C. L. R. James ou Faye Harrison, do cânon de disciplinas como a Sociologia, a História ou a Antropologia.
Esta Conversa a Sul procurará – em diálogo com o conhecimento produzido no espaço académico e de militância política – contribuir para desafiar os termos da discussão eurocêntrica norteada pela branquitude como sistema de privilégio epistémico e debatendo as suas consequências na vida quotidiana de populações Roma/ciganas, negras e migrantes.

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Cayetano Fernández é investigador no Centro de Estudos Sociais (CES), atualmente integrado no projeto POLITICS – A política anti-racismo na Europa e América Latina: produção de conhecimento, tomada de decisões e lutas coletivas, particularmente na corrente de investigação “Culturas acadêmicas e Universidades Estatais: o estudo do racismo e do colonialismo no ensino superior”. Em colaboração com a Universidade de Granada (Espanha) e outras entidades, tem trabalhado em várias investigações relacionadas com os Roma em diferentes campos, como o acesso à educação da comunidade Romani, o processo de migração dos Roma da Europa Oriental para a Europa Ocidental, o papel histórico dos Romanies envolvidos na Guerra Civil Espanhola, e o estatuto contemporâneo da língua Romaní como construtor de identidade política entre os Roma espanhóis. Atualmente está inscrito no Programa de Doutoramento “Direitos Humanos nas Sociedades Contemporâneas” na Universidade de Coimbra e o seu tema de investigação centra-se no racismo na Academia, em particular, no anti-ciganismo produzido no campo dos chamados Romani Studies. Anteriormente, como bolseiro de investigação, conduziu investigação no departamento de Estudos Nativos Americanos da Universidade Estadual de Montana (EUA) e como bolseiro de doutoramento no departamento de Sociologia e Antropologia Social da Universidade da Europa Central (Hungria). Atualmente, faz parte da organização decolonial Romani Kale Amenge, um projeto que visa ligar a produção de conhecimento sobre a luta antirracista romaní e a intervenção política.

Cristina Roldão (Socióloga, ESE-EPS e ISCTE – IUL) | Socióloga, professora convidada da ESE-IPS e investigadora no CIES-IUL. As desigualdades sociais perante a escola são o seu principal domínio de pesquisa, com particular enfoque nos processos de exclusão e racismo institucional que tocam os afrodescendentes na sociedade portuguesa. Destaque-se a coordenação do ciclo de debates e curso de formação Roteiro para uma Educação Antirracista (2019), a participação no projecto “Caminhos escolares de jovens africanos (PALOP) que acedem ao ensino superior” (2015) e a participação no “Grupo de Trabalho para as Questões Étnico-Raciais – Censos 2021” (2018/19). Para além da produção científica neste domínios, tem participado no debate público alargado sobre o racismo e desigualdades étnico-raciais na escola e sociedade portuguesa. 

Miguel Vale de Almeida (Antropólogo, CRIA e ISCTE-IUL) | Doutorado em Antropologia, é professor catedrático no ISCTE-IUL e investigador do CRIA, onde dirigiu, até 2015, a revista Etnográfica. A sua pesquisa com trabalho de campo em Portugal, Brasil, Espanha e Israel/Palestina tem versado questões de género e sexualidade, bem como etnicidade, raça e pós-colonialismo. Tem vários livros publicados em Portugal e no estrangeiro, destacando-se Senhores de Si: Uma Interpretação Antropológica da Masculinidade, Um Mar da Cor da Terra: Raça, Cultura e Política da Identidade, Outros Destinos: Ensaios de Antropologia e Cidadania, A Chave do Armário. Homossexualidade, casamento, família e o mais recente Aliyah. Estado e Subjetividade entre Judeus Brasileiros em Israel/Palestina. Além de cronista e comentador, tem sido activista dos direitos LGBT e foi eleito Deputado à Assembleia da República em 2009, tendo estado envolvido na aprovação do casamento igualitário.